Manifesto da 7.ª Marcha de Viseu Pelos Direitos LGBTQIA+
“De cravo ao peito contra o preconceito!”
Em 2024 assinalamos sete anos de marchas de luta pelos direitos LGBTQIA+ em Viseu, sete anos de resistência e de memória queer no interior. Assinalamos também 50 anos da Revolução que permitiu a construção de um movimento político pelos direitos LGBTQIA+ em Portugal.
Na madrugada do 25 de abril de 1974 a liberdade saiu à rua derrubando, em menos de 24 horas, 48 anos de ditadura, um regime que criminalizava e perseguia as minorias sexuais.
Porém, ainda que o 25 de abril trouxesse consigo uma onda de transformações sociais não conseguiu com isso garantir que a liberdade chegasse a todas as pessoas.
A 13 de maio de 1974 era publicado no “Diário de Lisboa” o manifesto “Liberdade para as Minorias Sexuais”, do Movimento de Ação dos Homossexuais Revolucionários (MAHR). O manifesto recebeu uma violenta reação por parte do General Carlos Galvão de Melo, que tornara pública a sua posição quanto à revolução “não tinha sido feita para “putas e paneleiros!”.
A afirmação demonstrava o longo caminho que teríamos ainda de percorrer para que a liberdade fosse alcançada por todas as pessoas.
Vimos este ano, na comemoração do cinquentenário da Revolução dos Cravos, com um cenário político incerto que nos arrastara às urnas, que a História não nos vacina contra nada. Por infeliz ironia, por cada ano de liberdade foram eleitos um total de 50 deputados da ala da extrema-direita, os mesmos que saúdam os velhos tempos do antigo Estado fascista. Convictos na restrição da liberdade de escolha e equidade de oportunidades, com o objetivo claro de espalhar desinformação e ódio, fazem confundir estes direitos com o que dizem ser “doutrinação ideológica” e/ou ideologia de género.
A instrumentalização das crianças ao invocar falsamente preocupações com a sua segurança; a criação de distorções em torno da diversidade de género e orientação sexual; a censura e proibição de livros de temática LGBTI; o assédio quotidiano a famílias arco-íris; os crimes de ódio e as taxas de violência orquestradas contra pessoas LGBTQIA+ são apenas alguns dos tantos ataques ao caminho que se têm trilhado no que toca à liberdade de escolha e não discriminação no país. Circunstâncias que mostram não só resistência a qualquer tipo de mudança face às diferentes formas de desigualdade como contribuem para as reforçar.
A par disto vemos a falta de sensibilização e de vontade política para combater este assalto à democracia portuguesa e aos direitos das minorias sexuais.
Segundo o relatório da Agência dos Direitos Fundamentais (FRA) da União Europeia, lançado a 14 de maio deste ano, é apontado o aumento da violência e assédio contra as pessoas LGBTQIA+ na Europa. Portugal mostra não ser exceção, sendo que 38% da comunidade LGBTQIA+ mostra já ter sido discriminada por conta da sua sexualidade, identidade de género, expressão de género, ou características sexuais no país.
A situação mais grave, na qual Portugal supera a média europeia pela negativa, diz respeito ao bullying nas escolas. 74% da população LGBTQIA+ portuguesa já foi sujeita a bullying por colegas, nomeadamente através de ridicularização, insulto e ameaça, quando a média europeia é 67%. Os estudantes LGBTQIA+ continuam a ser intimidados por outros estudantes e ridicularizados por professores em algumas salas de aula. O que nos dizem os aurautos do evangelho e da proteção das crianças acerca destes números?
Por outro lado, o aumento do custo de vida e a crise geral da habitação, mostram afetar pessoas LGBTQIA+ de forma desproporcional. Segundo a Agência dos Direitos Fundamentais (FRA) da União Europeia, pessoas LGBTI representam quase metade da população sem-abrigo na Europa, sendo os jovens LGBTQIA+ uma das comunidades em maior risco de exclusão habitacional e de sem abrigo.
Ao nível da saúde, as questões mais diretamente ligadas à população LGBTQIA+ permanecem ausentes e a consciencialização sobre os temas é deixada à iniciativa individual dos profissionais de saúde. A falta de formação e de atualização nas práticas contribui para perpetuar a inadequação da intervenção, a invisibilidade e, frequentemente, a discriminação de pessoas LGBTQIA+.
Não há orgulho no genocídio!
Deixamos ainda uma mensagem de solidariedade para com os povos que lutam pela sua libertação, no Saara Ocidental, na Ucrânia, e na Palestina. Israel continua a impôr um regime de apartheid e de limpeza étnica sobre o povo palestiniano. Não há orgulho no apartheid, pelo que condenamos o pinkwashing praticado pelo Estado de Israel e existimos o fim da ocupação e da colonização dos territórios palestinos. Israel leva a cabo um genocídio mais de 40 mil pessoas na Faixa de Gaza até ao momento, dos quais 15 mil são crianças.
O movimento Queer em Portugal não pode nem tolera que em nosso nome, em nome de uma causa de direitos humanos, se pratique a guerra e que se imponha um regime imperialista. Não toleramos que se mate e oprima todo um povo, sob uma falsa imagem de tolerância para com a causa LGBTQIA+. Não em nosso nome!
Exigimos por isso o cessar-fogo imediato da agressão a Gaza, o fim da ocupação militar que coloniza o povo da Palestina e a Paz no Médio Oriente!
Para combater o ódio, a discriminação e a intolerância contra as pessoas LGBTQIA+ precisamos de medidas que se traduzam em respostas concretas. É altura de assegurar as especificidades da população LGBTQIA+, por isso:
Reivindicamos bem estar e integração social; autonomia e autodeterminação para todas as pessoas, também aqui no interior do país;
Reivindicamos habitação acessível; empregos estáveis; cidades sustentáveis; a promoção da equidade e a valorização da diferença;
Reivindicamos o exercício do direito das crianças e jovens à autodeterminação da identidade e expressão de género e do direito à proteção das suas características sexuais;
Reivindicamos o reforço dos serviços de saúde mental nas escolas e nas comunidades, incluindo as LGBTQIA+;
Reivindicamos o reforço de centros de acolhimento para pessoas LGBTQIA+ em situação sem abrigo;
Reivindicamos a garantia que vítimas de discriminação, intimidação ou assédio relacionados com a orientação sexual ou a identidade de género recebam proteção e apoio;
Reivindicamos a educação sobre igualdade de género, diversidade sexual, direitos em matéria de saúde sexual e reprodutiva e prevenção da violência;
Reivindicamos respostas públicas para o envelhecimento com dignidade das pessoas LGBTQIA+;
Reivindicamos políticas públicas que permitam a possibilidade de exercer as nossas escolhas de acordo com a nossa consciência.
Para que cada pessoa possa ser o que quiser.
Para que cada pessoa tenha a possibilidade de realizar os seus sonhos.
Nem menos nem mais, direitos iguais!
De Cravo ao peito contra o preconceito!
25 de Abril sempre, fascismo nunca mais!
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